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Avaliação Psicossocial

Entrevista: Atuação do Psicólogo Hospitalar diante do adoecimento dos profissionais de saúde

Uma mulher, parcialmente visível, fala próximo a um microfone com filtro anti-pop. O fundo é desfocado, destacando a interação e a fala da pessoa, criando um clima íntimo e envolvente típico de entrevistas em estúdios ou podcasts.

por Bianca Lopes

Segundo o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (2015), os profissionais da área da saúde são apontados como trabalhadores mais propícios a adoecerem mentalmente no exercício de sua profissão. Uma série de fatores pode gerar vulnerabilidade nos referidos profissionais cabendo ao psicólogo hospitalar intervir nesse processo de adoecimento.

 

  1. Um dos fatores citados é a baixa valorização do conhecimento e experiência desses profissionais. O que o psicólogo hospitalar pode fazer para tentar reverter essa situação?

A questão da valorização desses profissionais perpassa, muitas vezes, por políticas, o que envolve a carga horária desses profissionais, o valor que eles recebem no trabalho, as condições de infraestrutura, seja por meio da equipe, seja por meio dos materiais, e perpassa por outros fatores para além de uma atuação pontual, de uma escuta.

Dessa forma, a primeira coisa que o profissional da psicologia precisa é desse olhar mais abrangente sobre essas outras variáveis que vão interferir no processo. Isso é um fator muito importante para se entender de onde está vindo a desvalorização e saber onde o psicólogo pode atuar.

Estando ciente disso, é importante que ele consiga trabalhar e adentrar em programas educacionais ou de sensibilização da importância de valorizar os profissionais da saúde, seja por palestras, seja por levantamento de dados para levar aos gestores. Vai para além daquele trabalho que ele realiza dentro do hospital.

É claro que ele não funciona sozinho, enquanto isso o profissional pode implementar alguns programas de suporte psicológico para a equipe, trabalhar em grupo sobre os desafios dessa profissão, para que eles percebam que não estão passando por isso sozinhos, que é uma vivência cultural, para que consigam ter essa comunicação e facilitar a relação entre eles.

A promoção da compreensão mútua envolve mudanças culturais, sensibilizações macro, em nível social e esse trabalho com a própria equipe. São muitas vertentes para se trabalhar.

 

  1. Outro fator que colabora para o adoecimento seria a elevada autocobrança pelo sucesso do tratamento das pessoas a quem prestam serviço. De que forma os psicólogos hospitalares poderiam trabalhar para reduzir essas cobranças elevadas?

Um fator importante é estabelecer expectativas mais realistas com esses profissionais, o que se faz por uma escuta ou por um grupo e isso vai sensibilizando, estabelecendo o que de fato faz parte do trabalho desse profissional. Além disso, incentivar que consigam perceber que o trabalho deles é composto por inúmeras outras variáveis que não dependem só deles.

É preciso promover uma abordagem colaborativa. Eles têm membros em sua equipe com quem também podem dividir essa responsabilidade, que compartilham dessas angústias, facilitar a comunicação entre eles, porque muitas vezes essa pressão vem de um profissional da equipe para o outro, para o colega de trabalho, e também vem da família, dos gestores, todos ali cobrando resultados.

É preciso favorecer esse entendimento: o trabalho deles é colaborativo, tem uma equipe ali multiprofissional e, mesmo assim, entender que ainda sim existem limites para eles, limites, por exemplo, entre a vida pessoal e profissional, para que se possa enriquecer a vida desse profissional, para que ele não tenha apenas o trabalho como o fator que dá importância e significado para sua vida.

Quanto mais a gente enriquece a vida pessoal, mais temos equilíbrio para lidar com as adversidades que vão surgindo no trabalho. Outra intervenção é adentrar no processo de formação desses profissionais e promover esse tipo de discussão além dos processos profissionais, porque eles passam por cinco, seis anos aprendendo que eles devem salvar vidas, que eles não podem perder ninguém, que é garantia de sucesso se eles conseguirem curar as pessoas. Assim, o trabalho sobre a morte e a perda já é importante lá no processo de formação desses profissionais.

 

  1. Há pesquisas que apontam que os profissionais de saúde são tratados como pessoas que não possuem sofrimento ou que conseguem ultrapassar os limites humanos das dores e enfermidades. Qual é o efeito dessa atitude para a qualidade de vida desses profissionais?

Realmente existe esse olhar, até para os profissionais de psicologia: é psicólogo? Não pode adoecer mentalmente. É nutricionista? Tem que se alimentar de uma determinada forma. A gente tem essa cultura, essa cobrança, é muito social, e o que a gente tem como consequência? O adoecimento desses profissionais. A sociedade já sinaliza que você deveria se cuidar, você deve saber que não deve sofrer, que não deve adoecer.

A consequência é que o profissional passa a não conseguir reconhecer que ele está adoecendo, que precisa de ajuda, se torna difícil de perceber-se nesse processo.

Com essa falta de reconhecimento, nós temos o aumento de algumas doenças como o burnout, ansiedade, depressão e, como efeito, temos uma redução da empatia, do cuidado desses profissionais com seus pacientes, com as famílias de seus pacientes, aumenta a dificuldade de se relacionar com a equipe, porque eles estão adoecendo.

Logo, é uma sequência de detalhes que vão afetando, tanto em nível individual quanto coletivo, a relação entre esses profissionais e como o serviço é prestado ao paciente.

 

  1. Em sua opinião, qual a importância de o psicólogo hospitalar voltar sua atuação também para a promoção da saúde mental dos profissionais de saúde?

Temos que entender que o bem-estar dos profissionais não é apenas individual, ele não visa atender só aquele sujeito, aquele profissional.

Quando se dá o suporte ao profissional, o bem-estar passa a ser global: da equipe hospitalar, da qualidade do atendimento a ser prestado aos pacientes e às famílias, promove a melhoria na cultura do ambiente de trabalho, reduz o estigma de que esses profissionais são super-heróis; além disso, ainda há o trabalho em nível individual, a prevenção do adoecimento profissional. Os benefícios são inúmeros.

Comtato Psicotestes e Livros

Bianca Lopes

Graduada em Psicologia pela UESPI (2018); Especialista em Psicologia Hospitalar (Hospital São Marcos, 2022); Mestranda em Biotecnologia e Saúde (Centro Universitário UNIFACID Wyden). Atua como Psicóloga Clínica, Supervisora e Docente no Centro Universitário UNIFACID Wyden.

Referência

Cordeiro, Q., Razzouk, D., Lima, M. G. A. (2015). Trabalho e Saúde Mental dos Profissionais da Saúde. Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulohttps://www.cremesp.org.br/library/modulos/publicacoes/pdf/Trabalho_e_saude_mental_dos_profissionais_da_saude.pdf

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