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Psicoterapia Online – novas oportunidades e desafios
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Psicoterapia Online – novas oportunidades e desafios

A Resolução n. 11/2018, do Conselho Federal de Psicologia (CFP), regulamenta a prestação de serviços psicológicos por meio das tecnologias de informação e comunicação. O reconhecimento dessa prática amplia o campo de atuação do psicólogo, assim como promove uma maior acessibilidade da população a profissionais de saúde mental.

Desse ponto em diante, direciono-me aos colegas psicólogos para questioná-los: estamos preparados para utilizar tecnologias na Psicologia? Sobretudo na clínica, dúvidas são inevitáveis: seriam novos fenômenos clínicos, como o sigilo das informações, as resistências e o manejo de crises, dentre outras situações, ou seriam os mesmos que já lidamos há mais tempo? A meu ver, essa é uma pergunta que demanda reflexões. Com isso, divido a minha experiência sobre o estudo de processo-resultado da psicoterapia online durante meu doutorado em Psicologia Clínica no Laboratório de Estudos em Psicoterapia (LAEPsi), da Unisinos/RS, e, ao mesmo tempo, abordo minha prática de atendimento nesse contexto.

Homem sentado em um sofá segurando um aparelho tablet.

Internacionalmente, as pesquisas indicam resultados promissores da psicoterapia online. Em 2013, a Associação de Psicologia Americana (APA) formulou diretrizes sobre o atendimento em Telepsicologia – termo mais utilizado para identificar esse campo. Entretanto, no Brasil, ainda estamos na retaguarda desses resultados, haja vista a carência de capacitação dos psicólogos para atuarem nesse contexto e de pesquisas escassas na área que demonstrem a efetividade desse tratamento com a população brasileira, bem como um cenário tecnológico pouco acessível.

Dados brasileiros preliminares, coletados em parceria com a Plataforma Vittude, demonstram que o público que busca o tratamento online, em geral, são mulheres entre 25 a 34 anos e residentes no Brasil. Em termos de pesquisas brasileiras sobre psicoterapia por videoconferência, destaca-se que a maioria delas se direcionara para avaliar a relação terapêutica e/ou o resultado do tratamento, mas ainda não há registros de pesquisas sobre o processo psicoterapêutico, por exemplo.

Em relação ao atendimento clínico por videoconferência, embora se perceba como semelhante ao tratamento presencial, algumas especificidades técnicas as distinguem. Diferentemente do consultório presencial, não vemos o paciente por completo, logo, temos acesso limitado ao comportamento não verbal. Outra importante questão se refere à qualidade da conexão de internet. Não é raro o congelamento da imagem, quedas na conexão ou delay entre áudio e imagem. Essas situações precisam ser dialogadas entre a díade paciente-terapeuta, e acordadas como serão sanadas. Em minha prática, por exemplo, estabeleço desde o contrato terapêutico, realizado nas primeiras sessões, sobre como essas questões serão resolvidas. Embora não tenham sido determinantes para a continuidade ou o fracasso do tratamento em minha prática clínica, em alguns momentos causa estranheza perguntar “até onde você escutou?”, “conseguiu me ouvir?” ou “não consegui entender o que você falou”. Compreendo que a melhor forma para solucionar essas dificuldades é investir na relação terapêutica, além de contar com um aparato tecnológico de qualidade disponível.

Além disso, outro ponto de fundamental discussão refere-se à avaliação dos casos que chegam para atendimento a distância. Nem todas as pessoas podem ou devem ser atendidas nessa modalidade. Na Resolução n. 11/2018 do CFP, o atendimento é vedado a pessoas em situação de violência e violação dos direitos, e inadequado em contextos de emergência e urgência, devendo a prestação desse tipo de serviço ser executado por profissionais e equipes de forma presencial. Com exceção desses casos, realizo a avaliação inicial, busco material científico com indícios de efetividade de tratamentos online diante da situação clínica que estou avaliando, e, por fim, analiso tecnicamente – levando em consideração a minha abordagem teórica, se aquela pessoa se beneficiaria de um atendimento presencial ou não. Considero, na avaliação, não somente a minha habilidade para atendimento do paciente, como também a sua capacidade psíquica, por exemplo, seus mecanismos de defesa, recursos egoicos, capacidade cognitiva, diagnóstico clínico e motivo para consulta. Apenas depois dessa avaliação e tendo sido acordados os objetivos e as tarefas do tratamento, é que de fato se inicia a psicoterapia.

No decorrer da avaliação inicial, também se faz importante combinar com o cliente a corresponsabilidade sobre o sigilo das informações, ou seja, para que possa ocorrer o tratamento, ambos devem estar cientes de não divulgarem o atendimento na internet, de buscarem mecanismos de proteção, e, além disso, um local adequado para o atendimento, livre da presença de terceiros e com bom isolamento acústico, pois, mesmo acordando o sigilo do  tratamento, já passei por situações em que o paciente se encontrava na cafeteria de um shopping ou nas escadarias do prédio onde mora. Nesses casos, a sessão não ocorre. Combina-se uma nova sessão na semana, com objetivo de resguardar o setting e relembrar os acordos sobre o tratamento. Embora esses entraves possam ocorrer, benefícios também são presenciados: alguns pacientes já relataram se sentirem mais à vontade ao realizar a sessão em casa, enquanto outros afirmaram se sentirem mais seguros, e assim uma lista poderia ser descrita. Em minha perspectiva, não observo diferenças que poderiam inviabilizar a psicoterapia online.

De todo o modo, é fundamental que desde o início fiquem claras as “regras” do tratamento e que as registrem em contrato terapêutico por escrito. Aos psicólogos, antes de iniciarem os atendimentos, cadastrem-se no e-Psi do Conselho Federal de Psicologia, busquem plataformas de atendimento online que ajudem a garantir a segurança da informação, uma vez que programas, como o Skype não possuem parâmetros de proteção. Além disso, é importante se questionarem sobre serem possuidores de treinamento adequado para a utilização dessas tecnologias, e, se não forem, faz-se necessário buscar as formações atinentes.

Aos pacientes, antes de buscarem o tratamento online, verifiquem se possuem recursos tecnológicos adequados para receber o tratamento com excelência, como boa conexão de internet, local seguro e sigiloso, microfone e webcam, como também avaliem se não existiria algum serviço presencial de atendimento psicológico que poderiam consultar. Julgo que a terapia online pode ser promissora e que precisamos estar preparados para ofertar esse serviço de forma ética e segura.

Autor: Luan Paris Feijó, Psicólogo – CRP 07/24785.

Minicurrículo: Mestre e doutorando em Psicologia Clínica – Universidade do Vale do Rio dos Sinos/ Unisinos-RS. Membro do LAEPsi – Unisinos. Membro do Grupo de Trabalho sobre E-mental Health da Society for Psychotherapy Research.

 

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