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Autismo e Avaliação Psicológica no contexto do Trânsito

Um semáforo em uma rua urbana noturna com luzes desfocadas ao fundo, representando uma cidade moderna. Os sinais luminosos do semáforo apresentam peças de quebra-cabeça em vez dos habituais círculos simples de luz. A luz vermelha (parar) e a luz azul (seguir) estão ativas, com o padrão de peças de quebra-cabeça destacando-se como referência visual ao autismo. A composição evoca uma mensagem simbólica sobre atenção, inclusão e o impacto do autismo no contexto do trânsito e da avaliação psicológica.

por Aloma Bianca Goetzinger Justus

Um relatório recente divulgado pelo órgão de saúde americano, Centers for Disease Control and Prevention – CDC ou Centro de Controle e Prevenção de Doenças –, divulgou que a prevalência do autismo é de um caso em cada 36 pessoas. A epidemiologia ainda é incerta e no Brasil não há pesquisas abrangentes e atualizadas. Em 2019, foi sancionada a Lei 13.861/19 que obrigou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a inserir perguntas sobre o autismo no Censo; devido a pandemia, o recenseamento que abrange a temática foi adiado.

Com o aprimoramento do diagnóstico, seguido da consciência de familiares, profissionais e sociedade de uma forma geral, aumentaram os diagnósticos e os números são impactantes. O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM classifica o Transtorno de Espectro do Autismo – TEA, é classificado como um transtorno do neurodesenvolvimento, que deve se apresentar na infância e manifestado de formas e intensidades diferentes, por isso o termo Espectro.

Esse grupo de transtornos, se caracteriza como um padrão recorrente de comportamentos disfuncionais e que impactam o funcionamento social e cognitivo, podendo trazer prejuízos significativos nas esferas pessoal, social, profissional e acadêmica.

O TEA é caracterizado por prejuízos persistentes na comunicação e interação social, bem como padrões comportamentais restritos e repetitivos. Cabe ressaltar que essa condição não se encaixa em estereótipos, não existe um jeito certo de ser uma pessoa autista, mas sim, uma diversidade de sintomas. Também é muito comum que o diagnóstico envolva comorbidades, estudos estimam que as comorbidades mais comuns são epilepsia, distúrbio do sono, transtorno de atenção e hiperatividade (TDAH), ansiedade, estereotipia, comportamento infrator e deficiência intelectual (DI) (Bougeard, 2021).

O autismo não é uma doença e, portanto, não se fala em cura. É sim uma condição permanente que requer intervenções terapêuticas para promover a alteração do prognóstico. Em muitos casos é possível a pessoa assumir o protagonismo de sua vida, tendo atividades que tragam normalidade à sua rotina, dentre estas atividades, dirigir um veículo automotor. Para tanto, é necessário estar apto em algumas etapas de avaliação, dentre elas, a avaliação psicológica que investiga habilidades cognitivas, personalidade e aspectos comportamentais que podem sugerir risco a si ou aos outros durante a condução de veículos.

O ato de dirigir é uma atividade complexa e que envolve muitos fatores cognitivos e comportamentais. Wilson e col. (2018), em um estudo sobre direção veicular e pessoas com TEA, descreveram que a direção exige mecanismos de funções executivas elevadas para que o condutor consiga gerenciar e responder às diversas demandas e situações imprevisíveis e inesperadas. No mesmo artigo, menciona-se que as pessoas com autismo têm boa percepção acerca dos riscos envolvidos no trânsito; em contrapartida, demonstram maior lentidão no tempo de resposta, o que pode comprometer a direção segura.

Há diferentes definições na literatura, no entanto, de maneira geral, as funções executivas são um conjunto de habilidades cognitivas que são fundamentais para o funcionamento executivo do cérebro e faz com que consigamos gerenciar as tarefas diárias.

Em consenso literário, os subdomínios mais aceitos são a memória de trabalho, que é nossa capacidade de reter e manipular informações temporárias, a flexibilidade cognitiva, a capacidade que temos de nos adaptarmos a uma nova perspectiva e o controle inibitório, necessário para inibir respostas impulsivas, esta função é constituída por atenção seletiva, inibição da cognição e o autocontrole (Martins, 2021).

Algumas pessoas com autismo têm habilidades excepcionais em certas funções executivas, enquanto outros podem enfrentar dificuldades. Consequentemente é possível que pessoas com autismo possam enfrentar desafios desde as avaliações que precedem a habilitação, bem como a condução de um veículo. Não tem como pré-determinar o êxito devido o leque de possibilidades e comprometimento que podem ser identificados em cada pessoa, além disso, as habilidades executivas podem se desenvolver ao longo do tempo com apoio e intervenções adequadas.

O mais importante neste processo, é que a pessoa com autismo, possa encontrar um profissional que seja qualificado e capacitado, ética e tecnicamente, para oferecer um atendimento digno e respeitoso, garantindo o direito da pessoa autista no processo de habilitação.

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Aloma Bianca Goetzinger Justus

Especialista em Avaliação Psicológica, Perita Examinadora do Trânsito e Psicóloga credenciada ao Detran/PR desde 2014.

REFERÊNCIAS

Bougeard, C., Picarel-Blanchot, F., Schmid, R., Campbell, R., Buitelaar, J. (2021). Prevalência do Transtorno do Espectro Autista e Comorbidades em Crianças e Adolescentes: Uma Revisão Sistemática da Literatura. Psiquiatria de Frente. DOI: 10.3389/fpsyt.2021.744709.

Centers for Disease Control and Prevention. Prevalence and Characteristics of Autism Spectrum Disorder Among Children Aged 8 Years — Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network, United States, 2020. Disponível em: Prevalence and Characteristics of Autism Spectrum Disorder Among Children Aged 8 Years — Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network, 11 Sites, United States, 2020 | MMWR (cdc.gov) Acesso em 05 de maio de 2023.

DSM-5-TR – Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais/ American Psychiatric Association. 5.ed. rev. Washington, DC: Publicação da Associação Psiquiátrica Americana, [2022].

Lei 13.861/19 https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2019/lei-13861-18-julho-2019-788841-norma-pl.html <Acessado em 23 out 2023>.

Martins, A.V. P. (2021). Abordagens de aprendizagem e funções executivas: construtos relacionados ao controle e regulação do comportamento (p. 29). Monografia em Neurociências, UFMG.

Wilson, N. J., Lee, H. C., Vaz, S., Vindin, P., Cordier, R. (2018). Scoping review of the driving behaviour of and driver training programs for people on the autism spectrum. Behavioural Neurology. https://doi.org/10.1155/2018/6842306.

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