por Jhennyfer Menezes
Cabe aqui destacar que a atuação da Psicologia no binômio saúde-doença no trabalho da atividade policial militar deve estar ancorada na literatura especializada sobre esse tema.
Alvim (2006) volta seu olhar para as atitudes do comportamento humano em relação ao trabalho, isto é, o comprometimento, o envolvimento e a propensão a agir de determinada forma que se espera do indivíduo no espaço em que está inserido. A autora defende também que esses trabalhadores internalizam valores e exercem com prontidão os esforços para o alcance dos objetivos da instituição.
Da Cruz Santos e Prado (2017) enfatizam as consequências do modelo laboral da nossa realidade atual e o surgimento do sofrimento e adoecimento derivado desse fazer. As autoras abordam que os sintomas do adoecimento manifestado vão além das condições físicas do espaço onde os trabalhadores estão inseridos. Portanto, é válido considerar como esse trabalho é organizado, qual o tipo de tarefa que é executado, relações com as pessoas que compartilham do ofício e as relações de poder instaurado.
Em sua atividade cotidiana, depara-se com os mais diversos tipos de situações insalubres, derivadas da violência. O risco é toda condição ou situação de trabalho que tem o potencial de comprometer o equilíbrio físico, psicológico e social dos indivíduos, causar acidente, doença do trabalho e/ou profissional (Brasil/CNJ 2015).
Sendo assim, conforme defendido por Minayo (2008), os policiais militares são a categoria que atuam sob um grande risco, isso diz respeito à elevada probabilidade de ocorrência de lesões, traumas e mortes inclusive fora dos horários e locais de trabalho, tornando essa ocupação com o maior indicativo de tensão ao se deparar com o reflexo das condições de trabalho comparado aos demais profissionais de outras áreas. Portanto, esses fatores influenciam de maneira negativa nas relações pessoais, laborais e sociais desse policial militar.
Uma das variáveis desse adoecimento e sofrimento psíquico, ainda abordado por Minayo (2008), está associado a um trabalho que está diretamente relacionado ao perigo, como é evidente da atividade dos policiais militares, podendo gerar ansiedade nesses trabalhadores, atrelada a preparação de uma situação arriscada para enfrentá-la, tornando essas situações desfavoráveis.
Dentro da atividade laboral dos policiais militares, é válido citar algumas possíveis consequências dessa atividade verificadas na literatura, como o desempenho profissional afetado, estresse físico e mental, dificuldade de relacionamento, tanto no ambiente de trabalho quanto na esfera familiar, envolvimento com drogas ilícitas, isolamento, depressão e suicídio.
Dessa forma, podemos delimitar que o território onde o policial costuma atuar, além dos centros urbanos das cidades, são em zonas periféricas, áreas consideradas “vermelhas” pelo alto nível de periculosidade e nas proximidades de sua residência. E o ambiente de trabalho do policial, principalmente voltadas para a vertente operacional e de combate, é a rua, portanto, é válido pensar quais estratégias devem ser tomadas para pensar a saúde desse agente neste cenário.
Diante dos conceitos acima trabalhados e pensando pelo viés da redução e eliminação dos riscos do ambiente de trabalho proposta pelas ações integrais à saúde, cabe a reflexão de que o policial militar, uma vez que o seu ambiente de trabalho geralmente é na rua, vive riscos que não vão poder ser eliminados, e sim reduzidos. E podemos pensar além das responsabilidades da Instituição, mas também como do próprio policial militar.
Podemos verificar ações voltadas para os cuidados em saúde mental no trabalho e como são realizados os procedimentos frente às manifestações de sofrimento psíquico no ambiente de trabalho. Para Faiman (2012), os trabalhadores podem vir a receber os atendimentos pela equipe técnica psicossocial dentro da instituição e assim, receber possíveis diagnósticos e tratamento adequado.
Quando necessário, a equipe pode fazer o encaminhamento do profissional adoecido ao tratamento médico especializado, podendo o trabalhador vir a fazer uso de medicações e ser afastado do trabalho.
Sobre a decisão do afastamento, para a Faiman (2012) autora acima mencionada, partindo da premissa do afastamento desses trabalhadores, é importante que haja a reintegração profissional de trabalhadores afastados, possibilitando o emprego em postos alternativos de trabalho e favorecendo novas possibilidades de trabalho, o que pode vir a ser um aspecto limitador na organização das instituições atuais.
É importante direcionar a atenção da ligação de saúde-doença não somente por um viés individual. De acordo com Perez, Bottega e Merlo (2017), é necessário o cuidado da saúde dos trabalhadores, uma vez há evidências sólidas de sofrimentos oriundos do exercício profissional, assim como a apresentação de sintomas e prejuízos à saúde mental. Encontram-se dificuldades de acesso nos serviços de saúde no oferecimento do acolhimento necessário.
Assim, em Psicologia, podemos trabalhar na saúde, conforme explorado por Simonetti (2004), a partir da ampla possibilidade de atuação que visa à compreensão dos fatores biopsicossociais que estão associados à saúde ou doença dos indivíduos, que proporciona tanto a manutenção, a promoção e a prevenção da saúde e buscando o aperfeiçoamento de políticas públicas de saúde.
Nesse sentido, quando o policial militar reconhecer suas limitações e buscar de ajuda, cabe ao psicólogo, segundo Paranhos Cardella (2006), compreender o sofrimento singular, ajudando a tomar posse de sua própria vida, acolhendo as angústias que desencadeiam nos questionamentos de como viver nesses tempos de “guerra”.
Jhennyfer Menezes
Psicóloga, graduada pela Universidade da Amazônia (UNAMA). Especialização em Avaliação Psicológica pelo Instituto de Pós-Graduação e Graduação (IPOG).
Referências
ALVIM, M. B. A relação do homem com o trabalho na contemporaneidade: uma visão crítica fundamentada na Gestalt-Terapia. Estudos e Pesquisas em Psicologia, v. 6, n. 2, p. 122-130, 2006.
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução CNJ n.207, de 15 de outubro de 2015.
DA CRUZ SANTOS, A. R.; PRADO, J. O sofrimento no trabalho e seu impacto na subjetividade. Revista de Iniciação científica da FAMMA, v. 2, 2017.
MINAYO, M. C. S.; SOUZA, E. R.; CONSTANTINO, P; ASSIS, S. G.; SCHENKER, M.; SILVEIRA, L. M. B. ; Ribeiro, A.P ; CARMO, C. Missão Prevenir e Proteger. 1a.. ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2008. v. 1. 327p.
FAIMAN, C. J .S. Saúde do trabalhador – coleção clínica psicanalítica. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2012.
PEREZ, K. V.; BOTTEGA, C. G.; MERLO, A. R. C. Análise das políticas de saúde do trabalhador e saúde mental: uma proposta de articulação. Saúde debate, Rio de Janeiro, V. 41, N. Especial, P. 287-298, 2017.
SIMONETTI, A. Manual de psicologia hospitalar – o mapa da doença. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004. 201p.