Trending News

Blog Post

Dicas de Leitura

Pensamento clínico no diagnóstico da personalidade – Resenha

por Alan Ferreira dos Santos

Capa horizontal do livro "O Pensamento clínico em diagnóstico da personalidade".

Walter Trinca foi Livre-Docente e Professor titular pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IPUSP). Graduou-se em Psicologia, e obteve o título de Mestre e Doutor pela mesma instituição. É Psicanalista, Membro efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP) e da International Psychoanalytical Association (IPA).

Ocupa a Cadeira nº 40 da Academia Paulista de Psicologia e foi idealizador do Procedimento de Desenhos-Estórias e do Procedimento de Desenhos de Família com Estórias, que contam, no contemporâneo, com diversas dissertações e teses que aprimoram o método desenvolvido.

A obra tem como objetivo apresentar um estudo exploratório e experimental sobre os fenômenos denominados de formas de pensamentos clínicos. Tais fenômenos são definidos como as formas pelas quais o pensamento se conduz durante o ato diagnóstico.

O conceito de forma é utilizado para diferenciar do de conteúdo. Desse modo, a forma seriam as estruturas de pensamento relativamente constantes que se apresentam na atividade diagnóstica. Já o conteúdo, por sua vez, teria maior variabilidade, assumindo a propriedade de ser os dados das formas.

Tem-se como proposta produzir a sistematização de algumas formas de pensamentos clínicos e demonstrar suas características gerais, sendo ao todo 15 formas. Todas as formas são abordadas no decorrer de 18 capítulos.

O texto detém uma linguagem compreensível ao leitor, o que, muitas vezes, é de árdua transmissão em razão da complexidade temática. Em relação ao modo de exposição, as ideias encadeiam-se dentro de um tom ensaístico, uma vez que o autor propõe uma tese com vistas a gerar mais aberturas na investigação científica do que propriamente respostas definitivas, vejamos:

Ao pesquisar as formas de o pensamento se conduzir, realizamos um esforço de sistematização metodológica para o qual não encontramos, ainda, precedentes. Nesse caso, nosso trabalho pretende ser uma introdução ao assunto, com vistas a seu desenvolvimento futuro. E, por essa razão, está cheio de lacunas e imperfeições, próprias de um estudo pioneiro. Nem sequer o assunto é tratado de conformidade com a praxe acadêmica. Pareceu-nos, porém, indicado apresentar os resultados iniciais de uma pesquisa assistemática com a finalidade de incentivar críticas que possam aperfeiçoar, propiciando o surgimento de outras contribuições. (TRINCA, 2010, p. 17)

 

Assim, vemos o caráter inaugural que o trabalho abarca. No prefácio, descobrimos que a presente obra é uma tese de livre-docência e que foi apresentada no ano de 1982 para o Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IPUSP). É também exposto o objetivo primário da tese, que diz centralizar-se nas formas de pensamentos clínicos no ato diagnóstico da personalidade.

Na introdução, por sua vez, menciona que as formas de pensamentos clínicos são utilizadas pelos profissionais e que estes não têm conhecimento de estarem utilizando-as, pois essas modalidades de pensamento, em verdade, são modos de operação da mente, ou seja, são maneiras pelas quais a mente opera.

No primeiro capítulo, Apresentação das formas de pensamento clínico, faz uma exposição geral do pensamento formal, além de evidenciar a maneira pela qual essa formalização do pensamento se insere no contexto clínico, dando origem às formas de pensamento clínico. Aqui também menciona os aspectos metodológicos da pesquisa, caracterizando-a como: assistemática e experimental.

Em Apreensão do objeto presente, dado, capítulo 2, refere-se à primeira forma de pensamento clínico, no caso a apreensão do objeto presente, dado. Este se caracteriza pela atividade psíquica de apreender uma totalidade fenomênica que é dinâmica e organizada.

Esse processo é um meio pelo qual a mente humana opera, sendo que no diagnóstico da personalidade, a capacidade de o profissional conseguir efetivar esse ato o permite adentrar em aspectos globais da personalidade que jamais poderia fazê-lo caso estivesse observando apenas as partes, visto que esses elementos se apresentam apenas em uma visão de todo.

No terceiro capítulo, Identificação de objetos semelhantes ao da experiência anterior, descreve essa modalidade de pensamento em que a mente opera por ações identificatórias, tendo como base as ocorrências de experiências vividas e memorizadas.

Essa ação psicológica é intermediada pela analogia, descrita no capítulo 4, Analogia entre partes constituintes de um mesmo objeto, em que os conceitos de analogia interobjetal – semelhança entre objetos – e de analogia intraobjetal – semelhanças entre partes, entre os elementos internos do objeto – permitem a exploração dessa postura cognitiva.

Dispostas as operações anteriores, passamos para o quinto capítulo, denominado de Pensamento classificatório, que nos revela a existência de duas submodalidades, uma que ocorre na própria atividade diagnóstica e a outra que ocorre no fim desta.

Não fornece nenhum nome para a primeira, pois faz breve menção e segue desdobrando a segunda, denominada de classificação globalizadora. Nesta última, essa forma de pensamento clínico é imanente ao raciocínio nosográfico, de tal modo que essa disciplina se torna um modelo a ser estudado, pois é por meio dela que é possível verificar o modo pelo qual o pensamento se conduz em seu processo de criar categorias nosográficas.

Nesse caso, faz as devidas considerações em torno da importância dessa atividade, mostrando que para além das questões da rotulação diagnóstica e todas as suas consequências conhecidas, existe também, por outro lado, os benefícios da taxonomia psicopatológica.

No sexto capítulo, Recorrência à teoria, indica que a sua consistência está no profissional que, baseado em um vértice teórico, consegue descrever os fatos observados. Quando a mente comporta esse tipo de operação, automaticamente, induz significação aos dados coletados.

Posto assim, expõe procedimentos ou pré-requisitos necessários para que esse ato possa, de fato, se efetivar, pois assevera que pode haver uma explicação dos fatos observados que são insustentáveis, teórica e empiricamente.

Adiante temos o capítulo 7, Dedução, em que a categoria conceitual de mediação é expressa como um termo médio – denominador comum – da forma de pensamento clínico dedutivo. Isso significa que a dedução seria uma espécie de “ponte” entre o vértice teórico em que se sustenta a prática do profissional e os dados de realidade que obtém.

Em suma, pode-se dizer que a forma de pensamento clínico dedutivo permite ao profissional apreender os significados envolvidos na experiência singular do paciente, feito por intermédio de um arcabouço teórico que se pretende universal. Isto posto, a dedução seria o meio pelo qual é possível observar as regularidades psicológicas – que se encontram nas teorias consolidadas – no contexto clínico e singular.

A capacidade de qualificar os dados clínicos com base nas teorias incorporadas ao decorrer da formação, isto é, de encontrar o elemento comum que está nas teorias e no paciente real, é o que autoriza a produção de uma inferência dedutiva com base nos princípios do modelo teórico.

As Provas de hipóteses, capítulo 8, são complementares à dedução, pois, se houver uma postura de compreender as inferências feitas com base em uma teoria por meio da visão de serem hipóteses, isso terá como consequência a busca por provas que permita a confirmação ou refutação do postulado.

Em diagnóstico da personalidade, o levantamento de hipóteses e a busca por sua comprovação ou refutação se faz necessário, visto que é possível, com base nessa forma de pensamento clínico, confirmar ou infirmar a proposição hipotetizada. Se ocorrer a confirmação, é indispensável o levantamento de outras hipóteses e a verificação do grau de confirmação delas. Isso permitirá uma maior ou menor acreditação do postulado inicial.

Por outro lado, se houver uma infirmação, o imperativo de criação de novas hipóteses se realça. A prova de hipóteses é esse jogo de levantamento de postulado, comprovação e infirmação. Essa atividade aumenta a validade científica do ato diagnóstico e, paralelamente, intensifica a seguridade dos resultados.

No nono capítulo, Denominador comum, essa modalidade designa o ato mental que faz a sondagem de elementos que se repetem ao decorrer da atividade diagnóstica. Esses elementos que se reiteram são os fatores decisivos que se encontram em todo o material. Designar esses fatores é uma maneira de adentrar na organização total da personalidade em seus aspectos essenciais.

Em Pistas indicativas da solução, capítulo 10, descreve-se os caminhos que a cognição percorre durante o processo de encontrar soluções para as hipóteses levantadas. Nesse caso, o psiquismo é alertado por meio de sinais, indícios, facetas e propriedades que se configuram como pistas. Essas pistas tornam-se, assim, um instrumento semiológico de grande valia, em razão de esses rastros promoverem a construção de imagens mentais que guiam a atividade psicodiagnóstica.

Já no capítulo 11, intitulado Articulação das partes entre si, a sua principal finalidade é propiciar a descoberta da função dos elementos do objeto, de modo a situá-los em relação à totalidade intraobjetal. Em tal caso, pretende-se chegar à definição do contexto global do objeto por meio da função particular de cada elemento no interior daquele.

Em Exclusão das alternativas menos verossímeis de um processo de tentativas, capítulo 12, chama-nos atenção o fato de que o exemplar analisado é nada menos do que um caso clínico de Donald Winnicott (1986-1971). Essa modalidade de pensamento clínico é analisada com base na narrativa do pediatra inglês, que se utiliza dessa forma de pensamento para nortear as suas conclusões.

Quando falamos de Visão simultânea de conjunto, no capítulo 13, noções auxiliares de síntese, integração, totalidade, unidade e globalização se fazem presentes. Em termos de atividade cognitiva, esta pode definir-se nas palavras do autor como “[…] uma visão inclusiva de conjunto que distingue as partes e ao mesmo tempo, a inserção de cada uma no contexto globalizado” (TRINCA, 2010, p. 144).

No capítulo 14, nomeado como Fechamento, Max Wertheimer (1880-1943) é a referência para subsidiar a reflexão. Aqui vemos que o fechamento ou a conclusão de um raciocínio tem uma dinâmica contextual, uma vez que a conclusão é colocada como uma consequência da existência das estruturas formativas que se constituem em seu fundamento nas premissas.

As premissas, as hipóteses e os seus testes de provas vão formando estruturas de pensamento diagnóstico que acabam por incidir em uma conclusão, ou fechamento do raciocínio.

Em Imagens intuitivas, capítulo 15, discorre sobre as representações mentais que emergem no profissional e que, muitas vezes, referem-se a processos psicológicos que se encontram no paciente.

Justifica que essas produções ocorrem porque na interação entre duas pessoas pode haver uma comunicação não verbal que se expressa por meio dos gestos e da atmosfera psíquica que se estabelece em decorrência da relação.

Os capítulos 16, O sentir, em contexto mais abrangente, e 17, denominado de Insight, são desenvolvidos na direção sobre como é possível a mente produzir soluções e conclusões que não tenham como base as formas de pensamentos clínicos anteriores, e que só se apresentam na forma de pensamento que conjuga traços cognitivos racionais e afetivos.

O sentir de modo mais generalizado promove a captação de sutilezas. Já o insight, por sua vez, corresponde a uma conclusão estrutural significativa que designa uma compreensão profunda e detalhada do fenômeno estudado.

Por fim, a obra finaliza com um convite aos interessados em explorar as formas de pensamentos clínicos, além de sugestões de como poderiam fazê-lo. O estudo tem como público-alvo principalmente os profissionais da Saúde Mental, não obstante, é sujeito ao interesse de pesquisadores das áreas de Humanidades em Geral.

Alan Ferreira dos Santos

Psicólogo e Especialista em Neurociência/Psicopedagogia. Pós-Graduando em Neuropsicologia da Psiquiatria pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Coordenador-Geral do Grupo de Pesquisa em Psicoterapias Existenciais e Humanistas (GP-PEH/CNPq) da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), e deste grupo Coordenador das Linhas de Pesquisa em Fundamentação Teórica das Ciências Clínicas do Mental (LP-FTCCM/CNPq) e Psicoterapia Neurodinâmica (PN/CNPq). É resenhista da Editora Vetor.

 

Livro O Pensamento clínico em diagnóstico da personalidadeSe gostou da resenha, certamente irá adorar a obra O Pensamento clínico em diagnóstico da personalidade. Adquira já!

Como se pensa em psicologia clinica? Sera que realizamos um pensamento valido e adequado aos fatos? Como se pode descrever as formas pelas quais pensamos clinicamente? E as formas existentes que ainda nao utilizamos em nossas atividades?

Essas e outras questoes sao tratadas cuidadosamente neste livro, destinado a todos os profissionais da area de saude mental. Ele se ocupa das formas pelas quais o pensamento se norteia ao buscar suas formulacoes clinicas. Sendo resultado de pesquisa e de experiencia clinica, este livro parte das formas validas para o pensamento em geral, determinando as modalidades de pensamentos que normalmente se aplicam ao diagnostico psicologico, a psicoterapia e a psicanalise. Foi escrito por um pesquisador consciente das dificuldades pelas quais passa o profissional que nao se da conta dos caminhos que percorre seu funcionamento mental.

Posts relacionados

Deixe um comentário

Campos obrigatórios. *