por Luiz Francisco Jr
Para iniciar esta reflexão acerca de uma atividade especializada da área de gestão de pessoas, torna-se fundamental ressaltar que o referencial aqui abordado trará um olhar pautado na conexão entre a perspectiva técnica e procedimental defendida e abordada pela psicologia organizacional propriamente dita e o viés crítico proposto e utilizado pela psicologia do trabalho.
É imprescindível poder contar com a perspectiva técnica oriunda da psicologia organizacional, pois as relações de causa e efeito, os elementos quantitativos e o entendimento do sistema econômico vigente possibilitam compreender uma parte das ocorrências no contexto corporativo, mas também com a perspectiva social derivada da psicologia do trabalho, que busca um significado para o trabalho e estabelece uma relação entre vida psíquica e o sujeito.
Seguindo essa proposta que foi descrita, cabe relatar que uma postura exigida pelas áreas de gestão consiste em três ações fundamentais, a saber:
- acreditar que essa área é um espaço de transformação e desenvolvimento, não se deixando sucumbir por uma cultura organizacional de desumanização e tecnicismo, considerando que cada convite, projeto ou demanda é uma oportunidade de aprimoramento profissional;
- proporcionar ações de desenvolvimento, ainda que pontuais e dentro de um limite mínimo, mas com frequência e consistência a ponto de ser possível notar ações transformadoras;
- viver o desenvolvimento, uma vez que só se pode ofertar aquilo que se tem verdadeiramente até para que as ações não soem superficiais, plásticas ou incoerentes.
Essas observações foram levantadas aqui como uma espécie de alerta aos profissionais que buscam implantar e manter o desenvolvimento de procedimentos de gestão de pessoas nas organizações em que atuam, tendo a clareza de que para que se possa fazer um trabalho consistente na área é preciso atentar e cuidar das condições contextuais, caso contrário o trabalho não se sustentará por muito tempo, além de poder apresentar gaps em sua estruturação e execução.
Dessa forma, o alerta se aplica àquelas organizações que decidem investir num trabalho de clima organizacional, o qual muitas vezes é equivocadamente reduzido à pesquisa de clima, o que empobrece e limita essa ação diagnóstica detalhada e minuciosa. Cabe ressaltar que em alguns casos a pesquisa propriamente dita pode até não se realizar, tendo em vista os diversos dados que podem ser levantados por meio da observação e análise de documentos e produções resultantes de outros procedimentos técnicos da área de recursos humanos.
Desenvolver ações voltadas à observação e à verificação do clima de uma organização significa coletar das mais diversas formas e nas mais variadas fontes disponíveis as percepções resultantes de uma construção autônoma dos trabalhadores, sobre as políticas e práticas organizacionais pautadas pelas interações vivenciadas na atmosfera psicológica do ambiente corporativo.
Não se deve jamais deixar de compreender que essa ação tem como objetivo o estabelecimento de um diagnóstico das principais necessidades ou faltas percebidas no cotidiano pela equipe de trabalhadores de modo compartilhado, ou seja, num entendimento e relato coletivo.
Em outras palavras, investigar as condições do clima de uma organização denota se apropriar das questões e carências motivacionais de cada trabalhador acerca dos diferentes fatores e elementos da realidade em que estão inseridos, resultando numa análise quantitativa que soma cada relato ou descrição individual para a construção de dados grupais que definam e caracterizem a empresa, e numa análise qualitativa que se dedica a desenhar planos de ação para mudança ou minimização dos quadros de insatisfação e frustração resultantes desse diagnóstico.
A organização que opta por investir no diagnóstico de clima possivelmente já deve estar observando ou suspeitando de situações desgastantes que podem envolver relacionamentos conturbados, assédio e agressividade, índices crescentes de afastamento, turnover e ausências, descontentamento com aspectos estruturais e ergonômicos, além da insatisfação frente às ofertas de recompensas, reconhecimento e benefícios oferecidos para atração e manutenção do capital humano.
Nesse sentido, uma das alternativas que as organizações têm para mapear o clima é por meio da análise dos aqui denominados elementos interseccionais que nada mais são do que resultados provenientes dos diferentes procedimentos técnicos que costumam ser realizados pelas áreas de recursos humanos. Isto significa que reunir, analisar e sintetizar os conteúdos provenientes das entrevistas de desligamento, do histórico de desempenho, da resposta aos feedbacks institucionais, da observação da estrutura hierárquica, do levantamento de necessidades de treinamento, das avaliações de resultado dos treinamentos e do nível de alcance dos objetivos organizacionais permite uma rica e aprofundada análise sobre a percepção compartilhada da equipe sobre o contexto organizacional vigente.
Todavia, caso a organização deseje compreender mais aprofundada e detalhadamente cada um dos aspectos identificados na análise dos elementos interseccionais ou então pretenda efetuar uma espécie de prova real em relação ao que foi levantando na análise dos procedimentos supracitados, pode então ser adotada a metodologia de uma pesquisa de clima, que tanto pode ser desenvolvida pela própria organização quanto se basear em escalas e modelos presentes na literatura especializada da área de recursos humanos e psicologia organizacional.
Recomenda-se que para que uma pesquisa de clima seja bem-sucedida é preciso seguir algumas etapas que estruturam e sistematizam o trabalho de modo a aumentar a chance de eficácia do referido procedimento. Portanto, antes de iniciar a pesquisa, os objetivos de se investigar o clima organizacional devem estar bem claros, fundamentados e alinhados entre a direção e a área de gestão de pessoas. Caso a organização decida criar um instrumento de pesquisa personalizado, não deve deixar de estruturá-lo e validá-lo junto a profissionais de fora da organização.
Também precisa ser definida a amostra, o prazo de preenchimento e a sistemática de aplicação, garantindo o anonimato absoluto de todos os participantes. A condição anônima que garante o sigilo das informações, as orientações do preenchimento e a importância do procedimento devem ser discutidos em um momento formal de encontro e sensibilização dos trabalhadores, momento em também deve ser pactuada a forma de devolutiva e apresentação dos resultados para que o trabalho de clima não perca sua credibilidade.
Finalizada a coleta dos dados e realizada a compilação, análise e compartilhamento dessas informações junto à direção e aos trabalhadores – ainda que em formatos diferentes considerando as peculiaridades e necessidades de cada uma dessas instâncias – pode então dar-se início aos processos de implantação de mudanças e melhorias apontadas pela pesquisa e demais dados analisados.
Trata-se aqui de um momento de suma importância para a cultura e os valores organizacionais, pois se, após uma pesquisa de clima, nenhuma mudança, adaptação, ajuste ou minimização de alguns dos principais problemas apontados pelos trabalhadores ocorrer de modo concreto e minimamente ágil, além do aumento notório da frustração pela expectativa gerada sem nenhum ou com pouco retorno, o interesse e engajamento em ações diagnósticas futuras tendem a ser cada vez menores por conta do descrédito que pode caracterizar um trabalho inconsistente de clima.
Nesses termos, ressalta-se sempre a necessidade de se estabelecer previamente um orçamento destinado ao investimento nas alterações necessárias para dar conta do que foi apontado, bem como responsáveis por acompanhar essas ações e tempo dedicado para que tudo seja feito com qualidade, reforçando a essência técnica e constituinte de um procedimento de clima conectado ao subsistema de manutenção que se constitui da contrapartida oferecida pela organização ao seu corpo funcional como recompensa pelo trabalho e expertise oferecidos pelos profissionais que nela atuam.
Quer saber como avaliar o clima organizacional da sua empresa? Contate-nos!
Por Luiz Francisco Jr
Psicólogo, mestre em Bioiética, life coach pela Sociedade Latino-americana de Coaching e especialista em Psicologia Organizacional e do trabalho e em Avaliação Psicológica pelo Conselho Federal de Psicologia.
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