por Laudio Nogues
Na filial brasileira de uma empresa multinacional inglesa, a frente da operação frequentemente fazia visitas às células da oficina de turbinas aeronáuticas, mas não na intenção de fiscalizar, e, sim, de demonstrar presença.
Ao mesmo tempo, me colocava acessível para abordagens eventuais, pronto para dar retorno a qualquer indagação, sugestão ou até mesmo informalidades. Essa prática evidenciava uma mudança radical na postura gerencial e se mostrou altamente positiva – afinal de contas, era o primeiro presidente “made in Brazil”, falando português nativo com um certo resquício de sotaque carioca diluído pelos anos de residência em São Paulo.
Dentre muitas coisas que me chamavam atenção, havia um olhar especial para o uso correto dos EPIs (equipamentos de proteção individual): óculos, auriculares, máscaras, luvas, capacetes etc. Dependendo da atividade, determinados artefatos eram de extrema necessidade; a adesão ao seu uso de maneira recomendada sempre foi algo que suscitou alguma resistência devido a um certo incômodo.
Por outro lado, as razões para utilização eram inquestionáveis: estamos protegendo não apenas nossa própria saúde e integridade física, mas como a dos nossos companheiros de setor. Era preciso um trabalho de conscientização e aculturamento para vencer a barreira da resistência e da indisciplina.
Mas será que esse texto tem a intenção de conscientizar as pessoas sobre o uso de EPIs? Minha resposta: certamente não.
Em minhas diversas reflexões voltadas para a intenção de disseminar argumentos sobre os benefícios do emprego do mindfulness nas organizações, encontrei, em experiências próprias como agente facilitador de mudança cultural, um paralelo entre o avanço do uso dos EPIs e do mindfulness no ambiente de trabalho, em suma: o mindfulness é o EPI para as principais ameaças à saúde do trabalhador nos tempos modernos: estresse e ansiedade.
Tive esse insight em razão de conversas com diversas organizações e profissionais e me lembrei de tempos passados quando havia uma certeza racional do bem causado por algumas atitudes e a comprovada negligência prática reinante.
Percebo que estamos vivendo esse momento em relação ao uso de alternativas não-ortodoxas em um ambiente organizacional dominado por formalidades e ceticismo. No entanto, assim como o caminho na conscientização do uso correto dos EPIs e, mais recentemente, na aceitação do reconhecimento das emoções no ambiente de trabalho – através da ampla compreensão do que realmente vem a ser a Inteligência Emocional –, o mindfulness vem apresentando um aumento vertiginoso no número de pesquisas científicas, especialmente nos últimos vinte anos.
Paralelamente, encontramos o mesmo sentido da curva desde o pioneiro programa do Google – SIY (Search Inside Yourself), em 2007, na implantação de treinamentos no desenvolvimento de profissionais e liderança baseado na prática da Atenção Plena (mindfulness).
Mas por que o “mercado”, representado pelas organizações, iniciou esse crescente interesse em programas de mindfulness?
Segundo Margaret Chapman (*), a principal razão é que as intervenções baseadas em mindfulness estão sendo traduzidas em maneiras heterodoxas de abordagem aos desafios que as organizações vêm enfrentando há algum tempo, com consequências igualmente crescentes ano após ano.
Um dos grandes fatores de desvantagem na rota de conscientização para o engajamento em programas como o mindfulness, quando comparamos com os EPIs por exemplo, é que os danos causados pela falta deles (EPIs) são geralmente visíveis.
Da mesma forma, a alternativa para evitar esses danos são, também, objetos físicos, tornando muito mais direta a compreensão da necessidade no diagrama de causa e efeito; já o mindfulness resume-se em práticas regulares de treinamento mental na direção de uma maior consciência perceptiva da realidade, buscando, essencialmente, uma capacidade aumentada de foco momento a momento.
“Viver o momento presente, intencionalmente, sem julgamentos.” (Jon Kabat Zinn)
É um processo gradativo e evolutivo, imperceptível sob o olhar imediatista de quem quer ver resultados rápidos, sendo esse um dos maiores desafios que o mindfulness enfrenta. Principalmente em um contexto de maximização dos lucros a curto prazo.
No entanto, apesar das resistências, a expansão da compreensão dos grandes benefícios da incorporação do mindfulness nos planos de desenvolvimento do capital humano vem se mostrando consistente e frutífero.
Mindfulness e bem-estar
Autores do artigo de Ashridge sugerem que o mundo dos negócios foi “conquistado por descobertas do Instituto Americano de Saúde, da Universidade de Massachusetts e do instituto médico mente-corpo de Harvard.”
As conclusões destacadas incluem:
- redução dos custos do absentismo do pessoal causado por doença, lesão, estresse;
- melhoria da função cognitiva – incluindo melhor concentração, memória, capacidade de aprendizagem e criatividade;
- melhoria da produtividade e melhoria do bem-estar geral do pessoal e das empresas;
- redução da rotatividade do pessoal e dos custos associados;
- melhoria das relações empregador/trabalhador e cliente;
- redução dos prêmios de seguro de saúde para a empresa;
- uma responsabilidade empresarial visível e tangível;
- maior satisfação dos trabalhadores no trabalho.
Além da visão mais individual do bem-estar, questionou-se também as características do formato da educação executiva em relação a uma mudança de atitude voltada para a Responsabilidade Social.
Mindfulness e responsabilidade social corporativa:
Uma das características do estudo analisou a educação executiva e os tipos de intervenções que mudariam o comportamento gerencial.
Os resultados revelaram que:
- A educação executiva padrão, baseada em discussões engajadas e análises de casos, não facilitou que os gerentes mudassem para probabilidades mais altas de tomar decisões socialmente responsáveis;
- Programas de coaching baseados em técnicas de introspecção e meditação (mindfulness), sem qualquer discussão sobre tópicos de RSC (Responsabilidade Social Corporativa), impactaram significativamente na probabilidade de os gestores agirem de forma socialmente responsável;
- Uma intervenção de formação “não-ortodoxa”, baseada em técnicas de hatha yoga (posturas, relaxamento etc.), produziu um impacto positivo no comportamento socialmente responsável.
Como conclusão, parece claro que uma abordagem de sucesso para a sensibilização a respeito de intervenções como o treinamento em Atenção Plena no ambiente corporativo, dependerá, essencialmente, de uma comprovação mais assertiva com relação aos seus benefícios.
Serão necessárias mais do que boas intenções nessa interação, evidências de melhoria palpáveis tanto para trabalhadores quanto para o conjunto de índices corporativos expressos em métricas inusitadas demonstrando que assim como EPIs o mindfulness protege a saúde dos empregados melhorando a qualidade de entrega da missão empresarial.
“Não podemos parar a maré, mas podemos pelo menos aprender a surfar as ondas.”
(Jon Kabat-zinn)
Laudio Nogues
Instrutor em Mindfulness (Atenção Plena) pelo CPM – Centro de Promoção de Mindfulness; Certificado em Desenvolvimento Dinâmico do Potencial Humano pela Academia Brasileira de Ciências Mentais; Terapeuta em Psicologia Transpessoal pela UNILUZ – Universidade da Luz; Autor de artigo e criador da Metodologia de Gestão Humanizante.
Diplomado em Executive Coaching pela Kingstown College (Irlanda), entidade acreditada por (ICF) e (EMCC); Certificado em Personal & Professional Coaching pela Sociedade Brasileira de Coaching (SBC); Certificado em Positive Psychology University of North Caroline; Certificado em Design Thinking pela ECHOS, Escola de Design Thinking; Certificações em Business Leadership pela London Business Scholl (UK), General Management pela Cranfield School of Business (UK) e Global Leadership pela TUCK Business School (USA).