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Burnout hoje: desafios, estratégias e soluções para um problema global

A imagem em preto e branco retrata um homem sentado à mesa de um escritório, com a cabeça apoiada sobre os braços, transmitindo exaustão e desânimo. O ambiente de trabalho está repleto de itens comuns, como teclado, fones de ouvido, cadernos e uma xícara de café, reforçando a sensação de uma rotina intensa. O contraste entre a luz natural ao fundo e o tom escuro da cena destaca a sobrecarga emocional e física do profissional. A composição visual evoca o tema do burnout, enfatizando o impacto do esgotamento no cotidiano e a urgência de estratégias para enfrentá-lo.

por Fernanda Soares

O conceito de burnout surgiu nos anos 1970, descrito como um estado de esgotamento físico e emocional causado por trabalho de alta pressão, particularmente entre profissionais que lidavam diretamente com o cuidado de outras pessoas. Inicialmente, a síndrome era associada a características individuais, como excesso de dedicação ao trabalho e negligência ao autocuidado, e vista como uma resposta ao estresse laboral, especialmente em contextos de baixa valorização e reconhecimento.

Na época, ambientes de trabalho eram predominantemente rígidos e hierárquicos, com pouca atenção à saúde mental e ao equilíbrio entre vida pessoal e profissional. A pressão para cumprir responsabilidades intensas, em um contexto cultural que priorizava o esforço no trabalho, contribuía para o desgaste emocional dos trabalhadores.

Com a pandemia de COVID-19, o burnout se intensificou, afetando um número maior de profissionais. O trabalho remoto, o isolamento social e o aumento da carga laboral agravaram os sintomas dessa síndrome, que deixou de ser restrita a setores como saúde e assistência social, atingindo trabalhadores de diversas áreas.

O livro Burnout hoje: o que sabemos e como podemos lidar com ele? (Vazquez et al., 2024) examina a síndrome de maneira abrangente, abordando causas, consequências e estratégias para enfrentá-la. A obra destaca fatores como sobrecarga de tarefas, ausência de apoio social e expectativas irreais como principais contribuintes para o desenvolvimento do burnout. Essas condições levam ao esgotamento emocional, despersonalização e sensação de ineficácia, sintomas que impactam não apenas o bem-estar psicológico, mas também a saúde física.

Ilustração da capa do livro "Burnout Hoje: O que sabemos e como podemos lidar com ele?".Organizado por Ana Claudia Souza Vazquez, Clarissa Pinto Pizarro de Freitas e Claudio Simon Hutz, o livro explora a síndrome de burnout em profundidade, trazendo uma visão abrangente e atualizada sobre suas causas, prevalência, impactos e estratégias para prevenção e enfrentamento. A obra reúne contribuições de diversos autores especialistas.

A síndrome de burnout é um problema multifacetado que exige tanto uma compreensão clara de suas características quanto a aplicação de soluções direcionadas, como destacam Hans de Witte e Wilmar B. Schaufeli em seu capítulo. Além de definirem o burnout como um fenômeno relacionado ao trabalho, caracterizado por exaustão emocional, despersonalização e sentimento de ineficácia, os autores apontam estratégias preventivas e interventivas fundamentais para lidar com essa síndrome.

Entre as soluções sugeridas, está a implementação de mudanças no ambiente de trabalho que promovam maior equilíbrio entre demandas e recursos disponíveis. Os autores ressaltam que a sobrecarga laboral e a ausência de suporte social no ambiente profissional são causas primárias do burnout, indicando que intervenções organizacionais podem ser extremamente eficazes. Isso inclui ajustes no volume de trabalho, clareza nas expectativas profissionais e maior autonomia para os trabalhadores.

De Witte e Schaufeli também destacam a importância de práticas de prevenção individual, como o desenvolvimento do autoconhecimento e habilidades de gerenciamento do estresse. Técnicas como mindfulness, treinamento em resiliência e programas de bem-estar são ferramentas úteis para ajudar os trabalhadores a reconhecerem os sinais iniciais de burnout e tomarem medidas para mitigar seus efeitos.

Além disso, os autores sublinham que, para prevenir o burnout de maneira eficaz, é essencial adotar uma abordagem integrada que combine ações individuais com mudanças organizacionais.

As intervenções mais eficazes são aquelas que trabalham simultaneamente em ambas as frentes: além de melhorar a qualidade do ambiente de laboral, elas trabalham para fortalecer a capacidade dos trabalhadores de lidar com as causas do burnout (De Witte & Schaufeli, 2024, p. 39).

Abordando os avanços das pesquisas sobre burnout no Brasil, Ana Claudia Souza Vazquez, Clarissa Pinto Pizarro de Freitas e Claudio Simon Hutz destacam como a perspectiva da psicologia positiva tem contribuído para ampliar o entendimento dessa síndrome. Os autores analisam como fatores como resiliência, engajamento no trabalho e bem-estar psicológico podem funcionar como mecanismos de proteção, prevenindo o esgotamento emocional e melhorando a saúde ocupacional, especialmente em contextos desafiadores.

Eles utilizam como base a teoria Job Demands-Resources (JDR), segundo a qual o equilíbrio entre demandas e recursos no ambiente de trabalho é crucial para determinar o risco de burnout. De acordo com essa teoria, demandas excessivas aumentam o estresse ocupacional, ao passo que recursos adequados ajudam a mitigar os impactos negativos. Nesse contexto, a psicologia positiva entra como um recurso adicional, promovendo práticas que aumentem a capacidade dos trabalhadores em lidar com desafios e reduzir os riscos de burnout.

No contexto brasileiro, os autores destacam que o Burnout Assessment Tool (BAT) oferece maior sensibilidade para capturar as nuances culturais e organizacionais específicas do país. Ele permite que os pesquisadores e profissionais de saúde mental avaliem não apenas os sintomas clínicos de esgotamento, mas também o impacto das condições de trabalho e as possibilidades de intervenção focadas em fortalecer os recursos dos trabalhadores.

No contexto global, se em países desenvolvidos o burnout é frequentemente discutido em termos de condições de trabalho e sobrecarga profissional, na América Latina ele também está fortemente ligado a fatores estruturais mais amplos, como a instabilidade econômica, as altas taxas de informalidade no trabalho e a desigualdade social.

De modo geral, são poucas as ações de promoção de investigação que permitam aprofundar os determinantes mais relevantes, ou ferramentas de monitoração do estado de saúde mental, e que também promovam prevenção e tratamentos eficazes para melhorar a saúde dos trabalhadores, que é ainda mais relevante em condições causadas por emergências de saúde, crises econômicas, instabilidade política e social […] (Vinueza-Solórzano et al., 2024, p. 68).

Etri Bandeira Junior e Clarissa Pinto Pizarro de Freitas falam sobre o impacto do redesenho do trabalho e da segurança psicológica na prevenção da síndrome de burnout, destacando que ambientes de trabalho mais saudáveis, isto é, aqueles que favoreçam o bem-estar psicológico, podem reduzir significativamente os riscos de esgotamento emocional e físico.

Destaca-se a importância do redesenho do trabalho, que envolve a reestruturação das condições e organização das tarefas para melhorar o bem-estar dos trabalhadores, aumentar a eficiência e reduzir os riscos de doenças ocupacionais. Esse processo inclui a criação de ambientes mais colaborativos, equilibrados e flexíveis, alinhando as necessidades dos colaboradores com os objetivos da organização.

Entre os principais elementos do redesenho, destacam-se: flexibilidade, redefinição de funções e tarefas, descentralização, maior autonomia, ambientes colaborativos e segurança psicológica. O redesenho do trabalho não se limita às tarefas, mas também ao ambiente e às relações interpessoais e de liderança, criando condições favoráveis à saúde mental e emocional. Portanto, trata-se de uma estratégia eficaz na prevenção do burnout.

A relação entre adição ao trabalho (workaholism) e a síndrome de burnout é explorada em uma revisão integrativa que investiga como o comportamento compulsivo em relação ao trabalho pode ser um fator precursor do burnout, especialmente entre profissionais de saúde.

A adição ao trabalho é caracterizada por um envolvimento excessivo e desproporcional com as tarefas profissionais, na qual o trabalho se torna uma prioridade em relação a outras áreas da vida, como lazer, relacionamentos pessoais e cuidados com a saúde. Os autores destacam que, embora a dedicação ao trabalho seja frequentemente vista de maneira positiva, quando ela ultrapassa os limites saudáveis e se torna compulsiva, pode ser um importante fator de risco para o desenvolvimento do burnout. Isso ocorre porque o workaholism está associado ao esgotamento emocional, à perda de controle sobre o tempo de trabalho e ao desprezo pelas necessidades físicas e emocionais do indivíduo.

Os autores ressaltam a importância de diferenciar claramente o workaholism do burnout, embora ambos estejam interligados. O burnout é uma resposta ao estresse crônico, especialmente relacionado ao ambiente de trabalho, que se manifesta por exaustão emocional, despersonalização e sensação de ineficácia. Já o workaholism é um comportamento compulsivo e crônico que pode preceder o burnout, mas não é a mesma coisa. Enquanto o burnout é a consequência de um processo de esgotamento, o workaholism pode ser visto como um fator que contribui para esse processo.

Existem diferenças diagnósticas entre a síndrome de burnout, os transtornos depressivos e os transtornos de ansiedade. “Apesar do CID-11 (WHO, 2021) citar que para o diagnóstico de burnout os sintomas devem estar ligados exclusivamente ao ambiente de trabalho” (Maslach et al., 2001 apud Macedo et al., 2024, p. 135), os diferentes modelos teóricos compreendem que o burnout pode afetar a saúde, levando ao desenvolvimento de sintomatologia física e psicossomática, além de sintomas depressivos.

É discutido como os sintomas podem se sobrepor, mas enfatizam a importância de considerar o contexto ocupacional como elemento distintivo no diagnóstico do burnout.

A reflexão sobre a síndrome de burnout, evidenciada nos capítulos do livro Burnout hoje: o que sabemos e como podemos lidar com ele?, revela que o enfrentamento dessa condição exige uma abordagem multifacetada e integrada, tanto em nível individual quanto organizacional. O burnout, que historicamente afetava especialmente os profissionais da saúde, expôs, com a pandemia de COVID-19, a vulnerabilidade de trabalhadores em diversas áreas. Ao longo dos capítulos, destaca-se a compreensão crescente de que o burnout não é um fenômeno isolado, mas, sim, um resultado de múltiplas interações entre fatores individuais, sociais e organizacionais. As pesquisas atuais confirmam que a relação entre demandas excessivas e a falta de recursos adequados no ambiente de trabalho são determinantes críticos para o desenvolvimento do burnout.

O livro também aponta soluções práticas, como a implementação de intervenções tanto para os trabalhadores, no fortalecimento de sua resiliência e estratégias de bem-estar, quanto para as organizações, por meio do redesenho do trabalho e da promoção de segurança psicológica. Além disso, estratégias como o fortalecimento do apoio social e a criação de ambientes colaborativos podem contribuir significativamente para a redução do estresse ocupacional.

A importância de ferramentas de avaliação também se destaca, permitindo uma análise mais sensível às especificidades culturais e organizacionais do Brasil, fornecendo uma base para ações preventivas mais eficazes. No entanto, a verdadeira prevenção do burnout demanda não apenas a implementação de medidas reativas, mas um esforço coletivo que envolva uma transformação profunda nas condições de trabalho, visando equilibrar as demandas e os recursos, promovendo o bem-estar e a saúde mental dos trabalhadores.

Em síntese, a prevenção e o enfrentamento do burnout são complexos e exigem tanto a transformação do ambiente de trabalho quanto a capacitação dos indivíduos em lidarem com as pressões do cotidiano profissional. A interdependência entre as ações organizacionais e individuais, com o foco na psicologia positiva, revela-se fundamental para a construção de ambientes de trabalho mais saudáveis e sustentáveis.

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Fernanda Soares

Formada em Jornalismo pela Associação Educacional de Vitoria, é colaboradora da Equipe Psicoteste desde 2017.

Referências

De Witte, H., & Schaufeli, W. B. (2024). Burnout: o que é? O que não é? Em busca de prevalência, causas, consequências e soluções. In Vazquez, A. C. S., Freitas, C. P. P. de, & Hutz, C. S. (Eds.), Burnout hoje: o que sabemos e como podemos lidar com ele? (pp. 17-42). Vetor Editora.

Macedo, M. J. de A., Martins, D. S., Bermudez, M. B., & Dreher, C. B. Diferenças diagnósticas entre síndrome de burnout, transtornos depressivos e transtornos de ansiedade. In Vazquez, A. C. S., Freitas, C. P. P. de, & Hutz, C. S. (Eds.), Burnout hoje: o que sabemos e como podemos lidar com ele? (pp. 133-150). Vetor Editora.

Vazquez, A. C. S., Freitas, C. P. P. de, & Hutz, C. S. (2024). Burnout hoje: o que sabemos e como podemos lidar com ele? Vetor Editora.

Vinueza-Solórzano, A. M., Gómez-García, A. R., & Portolonza-Chavarria, C. A. Estudos de burnout em países da América Latina. In Vazquez, A. C. S., Freitas, C. P. P. de, & Hutz, C. S. (ed.). (2024). Burnout hoje: o que sabemos e como podemos lidar com ele? (pp. 67-90). Vetor Editora.

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