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Capacitismo e inclusão

Imagem vetorial linear composta por uma linha contínua que simboliza a silhueta simplista de cinco indivíduos um ao lado do outro, formando um grupo e, para representar a cabeça de cada indivíduo há um circulo vetorial em cima de cada curva que simboliza um indivíduo.

Por Marlene Alves da Silva

Resenha do Livro: Capacitismo e inclusão: contribuições teórico-práticas da psicologia organizacional e do trabalho, de M. N. Carvalho-Freitas & J. C. Santos. São Paulo: Vetor Editora.

O cenário contemporâneo é multifacetado e tem se mostrado contraditório e antagônico, pois apresenta mudanças socioculturais significativas na concepção da diferença e diversidade nas relações humanas e no trabalho e, ao mesmo tempo, as discriminações e os preconceitos variam desde a superproteção com as pessoas com deficiência à violência explícita do capacitismo.

Entende-se que o trabalho é um importante meio de inclusão social por se constituir uma via de acesso à renda, por ser uma atividade valorizada socialmente e por ser uma forma de desenvolvimento de potencialidades e criação de laços afetivos que repercute na saúde física e mental das pessoas.

Discutir as questões centrais emergentes da aceitação, inserção e inclusão de pessoas com deficiência no mundo do trabalho é a proposta desta obra escrita por Maria Nivalda de Carvalho-Freitas e Joelma Cristina Santos.

Capa do livro Capacitismo e InclusãoO livro se propõe a discutir de forma teórica e prática a importância do trabalhar para o ser humano, da questão da exclusão social, do preconceito e das propostas de ações em Gestão de Pessoas. A obra está dividida em quatro partes em um total de 19 capítulos.

A primeira parte intitulada Fundamentos da exclusão social e do preconceito é composta de dois capítulos; a segunda parte, do 3º ao 6° capítulo, discute o Capacitismo; a terceira parte, Concepções de deficiência e modelos teóricos, abarca oito capítulos, do 7° ao 14°; a quarta parte, O trabalho, inclusão e gestão da diversidade funcional, com 5 capítulos, do 15º ao 19°.

Nos dois primeiros capítulos, Fundamentos da exclusão social e alguns dos seus possíveis desfechos no trabalho e O preconceito como fundamento psicossocial da exclusão, as autoras apresentam o significado de exclusão como fenômeno social e organizacional que gera inúmeras consequências sociais, organizacionais e subjetivas como falta de sustentabilidade, violência, injustiça, desmotivação, dentre outras que se encontram na raiz dos conflitos sociais e a contribuição da psicologia social na visão de alguns teóricos.

A partir das ideias de Heller, discutem as fontes e motivações do preconceito vistos como decorrência da vida e, também, como um juízo provisório que facilita a manutenção dos hábitos e costumes da vida cotidiana e que favorece a alienação. Ademais, descrevem brevemente sobre a teoria da administração do terror e da teoria do contrato ou hipótese do contrato.

Na segunda parte, os capítulos são: Os componentes atitudinal, cognitivo e comportamental do Capacitismo, Aspectos individuais e estruturas do capacitismo, Impactos subjetivos do capacitismo para as pessoas com deficiência e para suas possibilidades de trabalho e Percepções de profissionais sobre o trabalho de pessoas com deficiência.

As discussões iniciam pelo Decreto da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e traçam um paralelo com as atitudes e comportamentos em relação às pessoas com deficiência a partir dos olhares de vários autores. Além disso, argumentam sobre os diversos aspectos e estruturas do capacitismo.

O capacitismo individual é uma atitude desfavorável e preconceituosa em relação às pessoas com deficiência; já o capacitismo estrutural é originário de uma ideologia que sustenta a forma de organização social e as relações produzidas, ou seja, oferece justificativas lógicas para a forma como a sociedade está estruturada e organizada apenas para as pessoas que atendem a seus pressupostos.

Nos impactos subjetivos do capacitismo, para as pessoas com deficiência e para suas possibilidades de trabalho, a referenciação da pessoa com deficiência, por meio do ativismo ou de outros modelos sociais, é importante porque essa identificação pode gerar repercussões benéficas na autoestima e na redefinição de traços estigmatizados.

As pessoas podem lidar com a deficiência em contextos discriminatórios e ter diferentes formas de atitude, o que determina são as características individuais, dos ambientes sociais ou das pessoas com as quais interagem.

No tocante às percepções de profissionais sobre o trabalho de pessoas com deficiência, esses profissionais de Recursos Humanos são os agentes de mudança social por terem um papel fundamental na manutenção ou na redução das barreiras impostas às pessoas com deficiências, principalmente no que se refere às possibilidades de acesso a emprego.

 

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Na terceira parte, capítulos de 7 a 14, Concepções de deficiência construídas historicamente e seus impactos na sociedade e no trabalho; A concepção teórica de deficiência de Modelo Individual; A concepção teórica de deficiência do Modelo Social; A concepção teórica de deficiência dos Estudos Feministas; A concepção de deficiência na Teoria Crip; A concepção teórica de deficiência do Modelo da Diversidade Funcional e Considerações sobre os principais modelos teóricos de deficiência; as autoras focam nas concepções e nos modelos teóricos e partem do pressuposto de que os processos psíquicos têm como condição de produção a existência e a relação entre duas ordens de fenômenos – uma organização biológica e uma histórica social – e discutem as quatro matrizes atinentes à deficiência (como fenômeno espiritual, como um desvio de normalidade, como questão social – concepção da inclusão social – e a matriz da interpretação técnica).

Além disso, apresentam as concepções teóricas da deficiência, como o modelo individual, também conhecido modelo médico,  que foram marcadas por descobertas científicas, entre os séculos XVII e XVIII, que compreende a deficiência como um impedimento corporal e/ou uma limitação anatômica da pessoa, que gera desvantagens sociais.

O modelo social, iniciado na década de 1970, tem como pressuposto de que um impedimento corporal (físico, sensorial, mental ou intelectual) e uma deficiência não são aspectos equivalentes, levando à modificação do modo de compreensão do estatuto ontológico da deficiência.

Como o modelo social apresentava algumas limitações, começaram a surgir estudos feministas da deficiência na década de 1990 problematizando a suposta distância entre esses campos, argumentaram e propuseram perspectivas mais complexas e abrangentes da realidade.

Autores como Marafon e Piluso falam da necessidade de que as demandas da pauta de deficiência sejam tratadas de forma transversal às políticas de gêneros e incorporadas, como categoria de análise, aos estudos feministas, num entendimento articulado.

Assim como a teoria CRIP, sistematizada por Robert McRur (2006), que utiliza de um termo derivado de cripple (aleijado), visto como pejorativo e subversivo, com o objetivo de destacar uma crítica à normalização dos corpos que destoam dos padrões normativos de anatomia, funcionalidade ou cognição.

A teoria CRIP, também compreendida como o questionamento do padrão de capacidade considerada normal, propõe a atribuição de novos sentidos às expressões depreciativas, e no que se refere aos corpos com deficiência, visa promover o reconhecimento de outras maneiras de corporificação possíveis,

No tocante ao modelo biopsicossocial, tem como base uma nova forma de avaliação dos aspectos que caracterizam uma deficiência com implicações práticas muito importantes, pois estabelece os critérios a serem utilizados para definir se uma pessoa tem ou não uma deficiência, a fim de validar o seu acesso aos benefícios sociais no âmbito das políticas públicas.

Para tanto, utiliza-se a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF em complemento ao Código Internacional de Doenças – CID. Já o modelo da diversidade funcional, foi originado em 2005 no Fórum de Vida Independente realizado na Espanha, com a proposta de pensar a deficiência a partir dos princípios da bioética como não causar dano intencional à pessoa (não maleficência) e buscar o maior benefício para o maior número de pessoas (beneficência), bem como respeitar e garantir o poder de decisão das pessoas (autonomia) e garantir o direito de todos (justiça).

Para maior compreensão do leitor e para rematar a terceira parte é apresentado um quadro comparativo onde tecem considerações sobre os principais modelos teóricos de deficiência.

A última parte da obra, aborda o trabalho, inclusão e gestão da diversidade funcional, com os capítulos de 15 a 19, Parâmetros da inclusão e suas implicações para a gestão do trabalho de pessoas com deficiência; Identificação das necessidades de intervenção em inclusão e definição de objetivos e metas; Avaliação para diagnóstico; planejamento e intervenção e Avaliação e comunicação.

A inclusão no trabalho é decorrência de uma adequada gestão da diversidade dentro das organizações que está associada às possibilidades de inovação, criatividade e abertura a novos valores. Para tanto, é necessário que o profissional busque identificar quais as necessidades dos clientes e como a ação de intervenção teria maior probabilidade de ser efetiva dentro do contexto organizacional.

Após, é necessário o processo avaliativo para diagnóstico das possibilidades de inclusão da pessoa com deficiência, sendo importante considerar parâmetros, como de inclusão, ético-organizacional e o psicossocial.

As autoras oferecem vários instrumentos em formato de inventário para esse processo de avaliação, a saber, inventário do parâmetro ético-organizacional; do parâmetro psicossocial; de percepção de barreiras atitudinais às pessoas com deficiência em situações de trabalho; de concepção de deficiência em situações de trabalho; de ações possíveis; de consequências de trabalhar com pessoas com deficiência (ICT) e o inventário de modelos de deficiência (IMD).

Nas ações de intervenção, que poderão ter características e métodos diferenciados a depender da abordagem teórica da deficiência como das dimensões a serem privilegiadas, é relembrado pontos importantes e apresentam a sensibilização e as etapas para a elaboração de ações de sensibilização.

Em seguida, apresentam o processo de recrutamento e seleção: recrutamento e seleção convencional; recrutamento e seleção baseados nos pressupostos do emprego apoiado e as etapas finais do processo seletivo.

A seguir, a socialização inicial: recepção, treinamento na função e acompanhamento; treinamento, desenvolvimento e educação e a avaliação de desempenho, progressão e carreira. Todo o processo de inclusão de pessoas com deficiência precisa ser avaliado continuamente e de forma sistemática para verificar se os objetivos e metas definidos estão sendo alcançados.

Uma estratégia interessante é avaliar antes e depois da intervenção utilizando questionários e/ou entrevistas e produzir relatórios que podem ser comunicados à direção da organização e aos funcionários em geral para acompanhamento e mudanças necessárias.

A obra se encerra com um glossário de termos utilizados em todo o texto. Trata-se de uma leitura fluida, de fácil entendimento e aplicabilidade, pois as autoras apresentam, ao final de cada capítulo, um caso com reflexões inerentes ao tema abordado no texto. A obra pode contribuir para os estudantes e os profissionais de psicologia e de áreas afins, em relação aos parâmetros de inclusão dentro das organizações.

Orient Consultoria de Psicologia LTDA

Autora

Marlene Alves da Silva – Psicóloga clínica, Pós-doutora em psicologia clínica pela USP, Mestre e doutora em Psicologia com ênfase em avaliação psicológica pela USF.

Especialista em Saúde Mental pela UFRJ, especialista em avaliação psicológica e psicologia do trânsito pelo CFP; Diretora da Clínica Fênix e da Orient Consultoria – Produtos e Soluções em Psicologia, professora convidada em cursos de graduação e pós-graduação latu sensu; pesquisadora da área de avaliação psicológica, clínica e de trânsito.

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