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Divertidamente – um olhar analítico

por Barbara Prado Zerbatto

Homem segurando um origami a frente de seu rosto e circundado por diversos outros origamis. O cinema, por ser uma forma de expressão artística, tem o potencial de tocar em aspectos profundos da alma humana. A linguagem artística e psicológica é a mesma: a linguagem da alma. Os desenhos e animações têm uma linguagem mais direta, cenários e personagens marcantes e roteiros envolventes. Falar de cinema, de animação, é falar também de psicologia analítica, imaginação e projeção de vivências humanas.

As projeções dos dramas humanos no cinema dizem respeito aos conteúdos arquetípicos, temáticas que são tipicamente humanas e que aproximam os espectadores, pois apresentam pontos em comum. A temática das emoções, que é o caso do filme Divertidamente, é um conteúdo arquetípico, comum a toda a espécie humana, independentemente de idade, cultura ou época.

O filme Divertidamente foi muito comentado em 2015, inclusive ganhando o Oscar de melhor animação. A protagonista, Riley, é uma menina de 11 anos que de repente se vê obrigada a mudar de cidade por causa do trabalho do pai.

O cenário principal do filme, entretanto, é o interior do cérebro da menina, um tipo de painel de controle de suas emoções, com várias telas, botões e comandos. Riley e todos os outros personagens têm cinco emoções atuantes: Alegria, Tristeza, Raiva, Medo e Nojinho, que se revezam na direção do painel de comando emocional.

Diante das diversas mudanças e adaptações vivenciados, o painel de controle de Riley começa a expressar emoções desconfortáveis, que não são muito bem aceitas, gerando conflitos. Depois de um desentendimento entre Tristeza e Alegria, ambas são ejetadas do painel de controle da menina. A partir daí, o filme retrata as tentativas de retorno das emoções ao painel de controle.

As emoções estão atuando o tempo todo, controlando as pessoas, como em Divertidamente. Para a psicologia analítica, as emoções fazem parte dos complexos que compõem a psique e estão em constante ação, sendo expressos de maneira particular.

Cada pessoa reage de uma maneira, dependendo do complexo que foi constelado na situação em questão e, também, da história e das experiências de vida.

Em seu livro Re-vendo a psicologia, Hillman (2010, p. 259) afirma justamente a autonomia dos complexos, arquétipos e emoções: “[…] já que as ideias apresentam visões arquetípicas, eu nunca tenho, de fato, ideias; elas me têm, me suportam, me contêm, me governam”. Esta é a ideia central de Divertidamente: o quanto os personagens são comandados pelas emoções e o quanto veem o mundo a partir da emoção que está no comando.

Entre o vasto universo de emoções existentes, a alegria e a tristeza talvez sejam duas das mais conhecidas e inicialmente vividas. O par de opostos em questão estabelece uma dinâmica de oposição e complementariedade no filme Divertidamente, retratando exatamente o equilíbrio que os opostos assumem.

Para a psicologia analítica, os opostos são um ponto-chave, uma vez que a psique humana é um sistema autorregulador, assim como todo o organismo humano, e busca sempre o equilíbrio e a compensação dos opostos.

Falar de tristeza em tempo de redes sociais, em que alegria e sorrisos são supervalorizados, torna-se muito importante. Em geral, a tristeza costuma ocupar o lugar de algo a ser evitado, sendo, portanto, negada. O filme Divertidamente traz uma mudança importante nessa dinâmica: inicialmente, a emoção principal da menina protagonista é Alegria, mas, diante das diversas mudanças – externas e internas –, as outras emoções passam a aparecer mais, inclusive a Tristeza.

A personagem Tristeza, antes passiva e destinada aos manuais e atividades desinteressantes no painel de controle das emoções de Riley, ao final do filme tem seu lugar e sua importância reconhecidos.

E é somente quando Tristeza tem seu espaço estabelecido que as emoções da menina Riley se transformam em emoções mais complexas, com a combinação de emoções. Assim, o filme Divertidamente resgata a importância da vivência dos opostos. Afinal, só é possível experienciar a alegria quando a tristeza é sentida.

A totalidade, a plenitude da vida exige um equilíbrio entre sofrimento e alegria. Mas como o sofrimento é positivamente desagradável, é natural que se prefira nem conhecer a medida do medo e inquietação para a qual o homem foi criado. É por isso que se diz sempre, benevolentemente, que tudo vai melhorar, que se vai alcançar a maior felicidade do mundo, sem pensar que a felicidade também está contaminada, enquanto não se completar a dose de sofrimento (JUNG, 2013).

 

Barbara Prado Zerbatto

barbara.zerbatto@gmail.com | CRP 08/20060

Psicóloga formada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). Especialista em Psicologia Analítica pela PUC-PR. Cursando especialização em Mitologia, Contos, Arte e Psicologia Analítica pelo Instituto Freedom.

Atua como psicóloga clínica pela abordagem analítica, atendendo a adolescentes e adultos em psicoterapia, grupos de estudos e supervisão clínica.

Referências

HILLMAN, J. Re-vendo a psicologia. Petrópolis: Vozes, 2010.
JUNG, C. G. A prática da psicoterapia. 16. ed. Petrópolis: Vozes, 2013.

 

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Tem por objetivo contribuir para a investigação dos variados padrões mal adaptativos de comportamentos, de pensamentos e de experiência e expressão emocional que abrangem integralmente os dois modelos diagnósticos (categórico e híbrido), descritos na quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5; American Psychiatric Association, 2013).

 

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