por Ana Paula Tinoco Damasceno
Neste artigo, proponho que conheçamos o que é o movimento maio amarelo, como ele surgiu e quais os nossos desafios e possibilidades de transformação da realidade em nossa prática profissional.
O Movimento Maio Amarelo nasce com uma só proposta: chamar a atenção da sociedade para o alto índice de mortes e feridos no trânsito em todo o mundo.
O objetivo do movimento é uma ação coordenada entre o Poder Público e a sociedade civil. A intenção é colocar em pauta o tema segurança viária e mobilizar toda a sociedade, envolvendo os mais diversos segmentos: órgãos de governos, empresas, entidades de classe, associações, federações e sociedade civil organizada para, fugindo das falácias cotidianas e costumeiras, efetivamente discutir o tema, engajar-se em ações e propagar o conhecimento, abordando toda a amplitude que a questão do trânsito exige, nas mais diferentes esferas.
Em razão da alta taxa de mortalidade e invalidez causadas por acidentes de trânsito em todo o mundo, a Assembleia Geral das Nações Unidas editou, em março de 2010, uma resolução definindo o período de 2011 a 2020 como a “Década de Ações para a Segurança no Trânsito”. O documento foi elaborado com base em um estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) que contabilizou, em 2009, cerca de 1,3 milhão de mortes por acidente de trânsito em 178 países. Aproximadamente, 50 milhões de pessoas sobreviveram com sequelas.
São três mil vidas perdidas por dia nas estradas e ruas ou a nona maior causa de mortes no mundo. Os acidentes de trânsito são o primeiro responsável por mortes na faixa de 15 a 29 anos de idade; o segundo, na faixa de 5 a 14 anos; e o terceiro, na faixa de 30 a 44 anos. Atualmente, esses acidentes já representam um custo de US$ 518 bilhões por ano ou um percentual entre 1% e 3% do Produto Interno Bruto (PIB) de cada país.
Se nada for feito, a OMS estima que 1,9 milhão de pessoas devem morrer no trânsito em 2020 (passando para a quinta maior causa de mortalidade) e 2,4 milhões, em 2030.
Nesse período, entre 20 e 50 milhões de pessoas sobreviverão aos acidentes a cada ano com traumatismos e ferimentos. A intenção da ONU com a “Década de Ação para a Segurança no Trânsito” é poupar, milhões de vidas anualmente, por meio de planos nacionais, regionais e mundial, , é o que informa o site oficial do movimento.
O mês de maio convida-nos a refletir sobre nossos desafios e contribuições como profissionais psicólogos do trânsito. A data especial traz a oportunidade de pararmos um pouquinho a nossa rotina de trabalho corrida e reavaliarmos a nossa atuação no contexto do trânsito. Temos muito a colaborar para um trânsito mais seguro.
Muitas vezes, somos o único contato que o cidadão tem com um psicólogo em anos ou em sua vida toda, temos a oportunidade de avaliar suas condições emocionais naquele momento e, independentemente de aprovar ou reprovar, olhar para a pessoa, acolher as suas questões emocionais e orientá-la da melhor forma possível e até mesmo encaminhar para outros profissionais se necessário.
No dia a dia atendendo um alto fluxo de motoristas em atividade ou pessoas que desejam habilitar-se para dirigir um veículo, temos a oportunidade de conhecer uma boa parcela da população de nossa região de atuação, observando diversas carências que explanarei adiante.
Uma delas é a necessidade de atendimento psicológico e/ou psiquiátrico. Diversas vezes nos deparamos com pessoas em sofrimento que não possuem condições financeiras e não sabem onde encontrar o atendimento, por isso é muito importante que tenhamos sempre em mãos o endereço e telefone dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) de nosso município para conseguirmos orientar as pessoas que necessitam.
Podemos observar também que a pandemia da Covid-19 agravou os transtornos psicológicos e nos trouxe uma demanda por acolhimento ainda maior que o habitual.
Atendemos muitas pessoas em situação de luto que não estão em condições de se submeter a uma bateria de testes psicológicos, no entanto, insistem em realizar a avaliação por terem perdido o seu emprego e precisam urgentemente da habilitação profissional para garantir o seu sustento e de sua família. Outra sequela que a pandemia nos trouxe é a extrema dificuldade financeira.
Diante de tal situação, temos o dever de acolher essas pessoas, “desligar o modo automático” de avaliação do trânsito e oferecer uma palavra de consolo para que nesse contato conosco essa pessoa perceba o quanto um psicólogo pode ajudar em momentos sombrios e se sentir ouvida.
Quanto à avaliação, podemos orientar a pessoa a remarcar quando ela estiver em condições emocionais de realizar a avaliação.
A baixa escolaridade ou o desenvolvimento intelectual abaixo do esperado para a escolaridade é um grande desafio que encontramos como peritos do trânsito.
As tabelas de correção dos testes estão melhorando a cada atualização e tentando contemplar a carência citada, mas essa realidade evidência o quanto o ensino no Brasil está precário, e diante disso podemos e devemos incentivar, motivar as pessoas a retomarem os seus estudos, praticarem a leitura, diminuir o uso do celular e fazer atividades que favoreçam as suas conexões neuronais.
Sabemos que a nossa realidade de trabalho exige agilidade para dar conta da demanda da população e muitas vezes temos pouco tempo para a realização de uma avaliação mais ampla e aprofundada, no entanto, precisamos estar atentos aos menores sinais de alerta para então aprofundarmos a avaliação a fim de se certificar de que aquela pessoa está sendo acolhida e não apresenta indícios de potencial risco para si e outros ao conduzir um veículo.
Ao realizar as estratégias propostas, estaremos contribuindo para a reconstrução da imagem bastante desgastada do psicólogo do trânsito e para o reconhecimento de nossa importância nesse contexto, uma luta constante de nossa classe, que, mesmo com todo o cenário atual e nossas contribuições, somos repetidamente ameaçados por políticas públicas que desvalorizam o nosso trabalho.
Por todo o exposto, convido cada um de nós a realizar uma autocrítica pessoal e profissional de modo a contribuir para um trânsito mais seguro, acredito que somos agentes de mudança e temos conhecimento científico e ferramentas para tal, como a campanha Maio Amarelo 2022 propõe: JUNTOS SALVAMOS VIDAS!
Desejo a todos um bom trabalho!
Ana Paula Tinoco Damasceno
Psicóloga, pós-graduada em Psicologia do Trânsito e proprietária da Logos Clínica de Psicologia.
Referências
MAIO AMARELO. Atenção pela Vida. Recuperado de https://maioamarelo.com/o-movimento/
Parabéns Ana Paula, o seu projeto eu penso da mesma forma tem que ter políticas públicas mais voltadas em questões sociais, como por exemplo acompanhamentos já nos primeiros anos de escola, tudo começa com disciplina e educação, valores morais e éticos.